“Vale”/Robson Hasmann

“Acentuo, de saída, a própria escolha da figura central do Vale das ameixas, Harley, o Timo. Há densidade na construção por causa dos vários elementos que o compõem. Um imigrante polonês, que deixou seu país por causa da guerra e experimenta a vida idosa no Brasil, com todas as dificuldades e violências típicas desse país ‘acolhedor’, e a que ele insiste em manifestar apreço e afeto.

Há muito o que se dizer dele. Por exemplo, o fato de ser professor de literatura. Essa característica se ajusta com precisão aos vários trechos em que se acentua uma linguagem marcada pelo erotismo, já que ele também é devotado às mulheres.

Esses pontos todos abarcam enormemente aquilo que para mim é o cerne temático do romance: a autoria. ‘O que é um autor?’, parece soar essa pergunta do início ao fim. Dentre os inúmeros trechos em que isso fica explícito para mim é quando surge um conto [reescrito; veja as duas versões, de 1975 e 2024] de seu primeiro livro, Globo da morte, atribuído à personagem Laís.

Nessa problemática da autoria, me chama a atenção ainda o ir e vir entre realidade e ficção. Por conhecer seu trabalho e dedicação aos livros de Osman Lins, salta rapidamente aos olhos não só a homenagem a ele, mas a densidade do diálogo – e aqui uso no sentido comum dado ao termo e ao conceito da teoria literária.  E por falar em homenagens, preciso mencionar que o ‘Disgreta’ de dona Benedita me soou como o ‘Nonada’ do Grande sertão: veredas, de Guimarães Rosa.”


(Robson Hasmann, professor de literatura, doutor em Letras pela USP e escritor.)

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