Globo da morte/Marisa

“Tirei um tempo (e lá se vão bastantes dias…) para ler Globo da Morte, com sua merecida Menção Honrosa no Prêmio Fernando Chinaglia em 1975.

Deu bem para entender por que Osman Lins se impressionou com o livro de um jovem criativo, em busca de caminhos originais para os seus ‘contos’, sabendo a priori que ‘O conto não existe’ – Sergio Sant’Anna – e certamente adotando a perspectiva da abertura existente na Narrativa.

A citação de Bandeira ‘Eu quero falar do que me der na cabeça’, bem como a de Joracy Camargo correlacionando ‘histórias sem fim e a Vida’, situam as diretrizes estabelecidas em sua criação literária. E isso você realmente mostra no livro.

As narrativas de um modo geral, mesmo as escritas dentro de uma perspectiva mais linear e tradicional, buscam temas instigantes que levam à reflexão. Apenas para exemplificar, ‘O Cômodo Novo’ leva-nos a pensar nas portas que mantemos fechadas em ambiente conhecido, mesmo quando tentamos abri-las.

‘Documento’ escrito sob forma de diálogo traz final inusitado, devido à indiferença e objetificação de um corpo humano morto na rua, com alguém querendo levar uma parte (mão) para casa; ‘Cosamea’ estabelece o contraponto entre as coordenadas técnicas (orientação acadêmica) na produção de um anúncio e a criatividade pessoal de quem trabalha o texto, trazendo ao final uma crítica sutil ao trabalho de avaliação docente; ‘Globo da Morte’ apresenta fragmentos numerados de pequenas histórias de Vida (nua?) que se alternam, complementam e fecham circularmente, à semelhança do globo que dá título à obra, situando o embate existencial entre a pulsão de vida e a pulsão de morte; ‘Domingo não precisa’ mostra ironicamente, através do discurso do empregador, a situação de ‘semi-escravidão’ da empregada que deve trabalhar e muito, de segunda a sábado: trabalhe, limpe, limpe, limpe, trabalhe e limpe, mas… Domingo não precisa!

Por fim, ‘O Túnel’ parece situar o leitor na transição do conhecido para o desconhecido (para onde o leva o ‘tubo/túnel’?). E me pergunto: não será a Literatura metaforicamente um túnel em nossas vidas?

Sim, Hugo, você sempre mostrou a que veio: ser escritor!”

(Marisa Simons, professora aposentada, doutora em Literatura Brasileira pela USP, autora de As falas do silêncios em O fiel e a pedra, de Osman Lins.)


Deixe seu comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados *